Identidade de marca, moda e a rebeldia como a (não) vilã da história

Isabella Lopes
4 min readJun 5, 2021

(A publicação contém leves spoilers de Cruella, como argumentos sobre a adaptação do conceito vilanesco para o longa e a relação do design dentro do filme)

Vamos falar da história da marca, do branding.

Mas antes…Vamos falar um pouco do punk?

Florescendo nos anos 70 nos EUA e no Reino Unido, o punk carregava a contradição ao sistema. Eram os rebeldes urbanos, artistas incompreendidos e inquietos, desafiadores da ordem e com voz ativa, os que querem e vão ser ouvidos. O punk, bem como outros movimentos de contracultura, serviu para traduzir novos grupos sociais e estilos de comportamento, contrariando padrões antes estabelecidos e até um pouco engessados.

No contexto das marcas, esses movimentos serviram para que elas se apoiassem a fim de construir sensações e experiências para o consumidor. Antes do conceito de tribos urbanas surgir, as relações funcionais de uma marca/produto se construiam apenas em aspectos táticos (como qualidade, função e preço) e começaram a perder o fator atrativo e competitivo dentro do mercado. Como aspecto tático também temos o design, que surge diretamente da moda, passando pela produção de carros até inspirar o design de embalagens, logos e etc. Entretanto, refém da lógica de consumo e a evolução das tendências, um design se torna obsoleto rapidamente no mundo industrial moderno, tornando-o uma função obsoleta nas marcas. Acabamos com muitas marcas/produtos de design semelhante, funções igualmente superiores, qualidades altas e equivalentes. Então como se diferenciar?

As corporações começam a pensar em aspectos estratégicos como fator de diferenciação, com isso, o branding. As marcas passaram de gondolas para viver em contextos sócio-culturais e se preocupar com as experiências de marca. O Branding no mundo mais atual, já melhor estabelecido como diferencial mercadológico estratégico, constrói também a identidade de marca, ou seja, como ela é identificada pelo consumidor e seus stakeholders. Identidade de marca (não estou me referindo a parte de identidade visual, como logos, mas isso está incluso em parte do processo) vai de uma essência, identidade cultural, pontos de contato, relacionamento até a lembrança que a marca causa.

E nesses pontos destacados, como as marcas, identidade cultural e o punk se alinham e onde entra Cruella nessa história toda?

A Disney apostou no filme live-action de “Cruella”, lançado no dia 23/05/2021 e podemos tirar algumas lições valiosas, como se inspirar em conceitos que às vezes são vistos como maus ou difíceis de lidar. Cruella mergulha no mundo da moda de Londres setentista em meio ao movimento punk, ponto que serviu perfeitamente de apoio para a construção da personalidade e motivações da personagem.

Cruella, no contexto da moda, criou sua identidade assim: rebelde, transgressora, talentosa e audaciosa (ela mesma cita “I was born brilliant, born bad and a little bit mad”). Uma desafiadora imponente da moda. O conjunto Design de moda e Identidade de Marca são aspectos fortes no filme e pensados de forma estratégica, pela personagem (dentro da história do filme) e pelo time de produtores, roteiristas e diretores (na construção do filme).

Vamos considerar Cruella (a personagem dentro do filme) como uma marca, com personalidade, uma missão, um propósito e uma identidade. Motivada por sua genialidade, a personagem quer chamar a atenção, independente de como e da maneira mais provocadora possível. Ela é rebelde e provocante, coisa que o próprio filme deixa para a perspectiva de cada um que julgue como “a vilã da história” ou não, no caso os personagens coadjuvantes e os espectadores são esses juízes.

As palavras “rebelde”, “desafiante” e “questionador” podem ser mal vistas quando simplesmente falamos sem estabelecer o contexto. Assim como a Cruella, esses atributos geram uma percepção muitas vezes negativa, mas temos contato com ideias e marcas que, quando sabemos o que fazem e como fazem, conseguimos ver a construção e valor positivo nesses mesmos atributos. É certo que Cruella trabalha com os aspectos que muitos julgam como algo negativo, mas ela ainda assim constrói sua marca, identidade e sua linha de moda seguindo todas essas características. Estrategicamente, ela ousa e cria sua marca no universo do filme, consciente que nem todos vão amá-la, alguns vão chamá-la de criminosa ou muito “dramática”, mas ela sabe bem quem ela quer atingir, qual o público que ela quer atrair para ela.

Vemos então como punk ajudou na construção do conceito histórico das marcas e serviu de gatilho para o desenvolvimento dos conceitos de branding. Ser uma marca “rebelde” e se inspirar no movimento não significa ser a vilã da história, só deixa claro que você está ali para desafiar padrões, levantar a voz para o que acredita e impactar o mundo, mas sabemos que nem todo o mundo vai concordar… e tá tudo bem!

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Isabella Lopes

I’m a creative strategist, a rebel designer, an artistic thinker and curious challenger. x