Um olhar para as estratégias das marcas na CCXP 2022

Isabella Lopes
10 min readDec 23, 2022

Retorno de uma nerd frequentadora de CCXP desde 2014, mas dessa vez recém-especializada em Branding. Uma análise sobre as estratégias e experiências das marcas presentes no pavilhão.

Depois de 2 anos em casa, chegou o momento dos amantes da cultura pop, assim como eu, voltarem ao tão querido pavilhão do São Paulo Expo para a CCXP — Comic-con Experience. Frequento o evento desde a primeira edição em 2014 (carteirinha de fidelidade tá em dia). Vi a evolução do ingresso, a crescente capacidade de público e até a presença das marcas no pavilhão, no meio da galera com seus stands erguidos para encantar o público.

Pela primeira vez, fui com um olhar novo, pois havia recentemente concluído minha especialização em Branding, Marketing e Growth. Sabe quando você estuda algo, tipo Design Gráfico, e de repente você está julgando os cardápios da padaria? Foi esse o sentimento.

Então dessa vez tive uma atenção e interesse maior por alguns pontos. Fora a experiência incrível de ser nerd em um lugar como esse, tive um olhar mais analítico e crítico para as marcas, com base nas minhas experiências anteriores do evento e com uma perspectiva voltada para estratégia de marca, estratégia de negócios alinhada à inovação e tendências de mercado, mas principalmente a construção das experiências de marca.

Diversidade & inclusão (real-oficial)

O primeiro ponto é sobre como as marcas mostraram sua cultura por meio de seus estandes, como levaram e reforçaram seus valores. Não, nenhuma delas fez um estande gigantesco temático sobre diversidade ou algo do tipo, simplesmente trouxeram a inclusão e diversidade de fato, com naturalidade e humanização, como deve (ou, pelo menos, deveria) ser. A Amazon em seu stand do Prime Video, contava com staffs com mobilidade reduzida de cadeira de rodas e pessoas com síndrome de Down auxiliando nas filas e interagindo com o público. Foi a primeira vez que vi de fato diversidade no evento e, não só isso, mas a inclusão dessas pessoas (sabemos que ser diverso e ser inclusivo são coisas diferentes e ambas devem caminhar juntas). Também vi intérpretes de libras para as apresentações no palco em uma das facetas do estande da Prime Video e um amigo que estava no auditório principal me disse que também havia um intérprete lá dentro.

Acessibilidade já é requisito básico hoje em dia né, deixou de ser diferencial assim como oferecer “qualidade” ou “algo funcionar de fato”. Infelizmente tem marcas ainda dormindo na fila, então foi legal ver estandes como o de Globoplay com rampas de acesso e piso tátil direcional instalado dentro do estande. Tornar um espaço acessível para todos é torná-lo inclusivo.

Piso tátil direcional contornando as áreas e ativações do estande da Globoplay

Estabelecer presença e se aproximar dos jovens

A surpresa de ver uma marca nova, sem entender o que ela está fazendo ali e quando você chega mais perto, contínua sem entender. Para a TV aberta, a Globo sempre esteve presente com Globoplay, mas esse ano as colegas de transmissão de TV aberta, Band e SBT, tiveram seus próprios stands. O estande não tinha uma estratégia de ser uma experiência da marca e sim um grande portfólio de programas, com um pouco de cada coisa. É claro que o palco temático de Silvio Santos não podia faltar e atraiu bastante gente curiosa sobre o que estava acontecendo ali, assim como eu.

Reforçando posicionamento de marca

A primeira da lista das novatas foi a Neosaldina que, do nada, vi um estande ali no meio do evento e fiquei mega curiosa. Claro que faz todo sentido a marca está ali, uma vez que ela em busca de se conectar mais com o público jovem, trabalhando com um posicionamento mais elástico, enfatiza a diversão sem a dor. Como melhor traduzir isso se não em um jogo com uma recompensa no final. No caso do remédio é o alívio, mas na CCXP eram os cobiçados brindes que toda marca te entrega ao participar pela ativação.

Outro movimento legal de ter observado nessa edição foi o aumento na diversidade de setores e categorias de mercado presentes no evento. Quando você pensa CCXP, remete automaticamente a marcas de produção audiovisual, games, colecionáveis, literatura, etc (marcas de moda e papelaria também são lembradas num segundo plano). Esse ano, para além dessas mencionadas, tivemos marcas de telecomunicações (Oi), financeiro (next), farmacêutica (Hypera com Neusaldina), alimentos & bebidas (Outback, Fanta e Cup Noodles) e marketplace (Mercado Livre). Isso demonstra o potencial de engajamento que o evento tem para essas marcas e a visão estratégica que estas tem sobre como se conectar cada vez mais com seus públicos de interesse.

Parcerias traduzidas em experiências

Novata no pavilhão, mas parceira desde a pandemia. O licenciamento da marca CCXP com Outback começou durante a pandemia, onde criaram lanches exclusivos para entrega delivery durante os dias de evento. Em 2021 tiveram um reforço no mundo digital com o investimento da rede de restaurantes em um jogo no metaverso (no servidor do GTA Cidade Alta) como parte da divulgação da CCXP, que teve sua segunda edição online.

Nesse ano a marca teve a sua chance de brilhar trazendo um restaurante para o pavilhão que representava perfeitamente estratégia comercial, a junção CCXP + Outback de “vibe” australiana misturada aos neons e cores vivas. A ação amplia a estratégia de posicionamento da marca para o público jovem, reforçando a atualidade e conectividade como atributos da marca.

fonte: Promoview | qtemprahj

A parceria com o marketplace que virou um market

Para onde você olhasse, tinha uma plaquinha escrito Mercado livre. Fora os dois estandes gigantes da marca: um com metade ativação interativa e parte loja de produtos licenciados; outro onde foram responsáveis por assinar um espaço de diversos pequenos comércios no melhor estilo mercado medieval (o Magic Market).

A marca foi claramente uma grande parceira da CCXP nesse ano, com uma estratégia 360 em inúmeros touchpoints do evento, nos próprios estandes e no patrocínio e entrega das compras na loja oficial da CCXP online. E a mensagem da marca é essa… de estar em qualquer lugar para aquilo que você precisar, desde a toalha até o sabre de luz.

Priorizar verba promocional versus “ir por ir”

Como um evento de cultura pop, os quadrinhos, filmes, séries e games são parte do DNA da CCXP. Na volta presencial, acho que esqueceram de chamar os games para essa festa. Voltando em 2018-2019, a Playstation e a Ubisoft foram marcas com estandes que, mesmo pequenos, juntavam uma galera. A Playstation já trouxe ativações de seus lançamentos exclusivos e/ou novas gerações do console (às vezes até com um estande só para o jogo e outro para a marca); A Ubisoft sempre trouxe um palco para o público poder se arriscar nas dancinhas do Just Dance. Curiosamente, ambas não apareceram esse ano… apenas um “puxadinho” no estande da Lupo para uma área de Just Dance, o que trouxe a percepção de estande “interativo” para a Lupo. Então fica essa dúvida… afinal, o estande era só da Lupo ou uma tentativa de presença da Ubisoft?

fonte: ABRAL

Uma possível justificativa da ausência marcante dessas marcas em comparação com anos anteriores é o foco de verba e estratégia das marcas para eventos específicos do segmento, como a BGS (onde a Playstation confirmou um dos maiores estandes) e a Game XP, onde o orçamento e a força de produção são maiores, então essas marcas tiveram que priorizar esforços para os eventos nesse momento. Outro fator pode ser devido à falta de grandes títulos para serem promovidos nesse ano em mais de um evento, então prioridades tiveram de ser estipuladas.

A Funko sem funkos

Faz todo sentido a marca mais amada de “figuras de vinil dos nossos personagens favoritos” estar em um evento como a CCXP, com a promessa de itens exclusivos… mas esqueceram de levar os benditos. Com um estande extremamente minimalista, haviam delimitações para organizar filas até as pequenas cabanas (os caixas) onde você comprava os funkos… ONLINE. Você verificava um tipo de cardápio dos modelos exclusivos e escolhia na hora para receber depois em casa.

Para os primeiros dias de evento, os produtos ficaram presos na Receita Federal, o que atrasou a chegada deles ao evento a tempo, já que a marca não tem filial no Brasil e as unidades são importadas. Aparentemente, tudo deu certo e os produtos chegaram nos dois ultimos dias do evento.

Para muitos fãs e embaixadores da marca*, foi triste ver a Funko sem funkos, enquanto outros estandes de lojas geeks estavam com os seus prontos e presentes para serem vendidos. Para o público geral menos engajado com a marca, houve impacto em awareness e potencial para conversão de vendas, em um espaço cuja função é potencializar a experiência sensorial de uma marca (então nesse caso não é só a ausência do produto, mas também o baixo apelo interativo e visual da experiência daquela marca).

*Considerando uma pessoa que frequentou o evento nos primeiros dias quando os funkos não haviam chego ainda.

Incoerência para o posicionamento da marca

Para quem já foi a uma loja conceito da Cacau Show, sabe a experiência alegre e bela que a decoração proporciona. Mesmo quem nunca foi, as lojas nos shoppings ou nas ruas são muito características que você sabe que aquela é uma loja da Cacau Show sem nem precisar ver o logo ou embalagens dos bombons. A personalidade da marca é traduzida nessas lojas e recentemente investiram na estratégia de contêineres como uma expansão da experiência de venda… mas também há as mesinhas com toalha marrom nem um pouco atrativas, umas no metrô e outras em eventos, como na CCXP.

Pesquisei de todas as formas para entender do que se tratava essa estratégia, se era algum sistema de revendedores ou algo do gênero, mas sem sucesso. A impressão que causa sobre a marca é que faltou verba, mas “precisamos estar nesse lugar de qualquer forma”, então recorreram a uma mesa simples com os produtos dispostos. Passa uma sensação de falta de cuidado e pressa, dois pontos que não condizem com a personalidade que a Cacau Show sempre transpareceu. Nada contra a ideia mesa em si, mas nesse caso é extremamente incoerente com o posicionamento e imagem que a marca construiu durante anos.

Mais rolê instagramável do que rolê interativo

Depois de 2 anos, os fãs contaram os dias para vivenciar suas marcas favoritas novamente (e quando digo vivenciar, é sobre ter experiências sensoriais, divertidas, interativas e imersivas).

Na era da experiência de marca, em meio a forte retomada de eventos presenciais, foi a edição de CCXP que teve menor indice de interatividade nos estandes. Boa parte das marcas levaram suas próprias lojas (desconsiderando as que sempre foram marketplace, como a Piticas), outras investiram em cenários instagramáveis, onde filas enormes se formavam para tirar 1 foto ao lado de um poster gigante, um cenário 2D de um quarto ou mesmo trono de ferro de sempre.

Essas são experiências divertidas, visualmente instigantes e condizentes, mas se compararmos com edições anteriores do evento, a quantidade de experiências interativas, como jogos, gincanas, dinâmicas, etc (e com brindes), foi consideravelmente menor nesse ano. Talvez esse seja um indicador de que a grande experiência atual da era das experiências é tirar foto… várias fotos em cenários diferentes.

Promoção através da experiência de marca

Além do espaço dedicado a comemoração de 100 anos da Disney e seus títulos de lançamento expostos em cenários instagramáveis, havia uma porção do estande exclusiva para o Combo+, Disney+ mais Star+. Com um palco para jogos de perguntas e respostas, um apresentador enérgico e uma fila enorme para participar (é claro), as perguntas eram sobre os conteúdos de ambos os streamings. Mostraram na prática que quem assina o combo+ está por dentro de tudo: super heróis, animações, esportes, séries de suspense, drama e fantasia.

A estratégia de marketing de venda caminhou com a estratégia de marca de forma muito clara. Enquanto se busca conseguir novos assinantes para ambos e enfatizar o custo-beneficio das 2 assinaturas em um combo promocional, também é uma tradução da potência da Disney no mercado de streamings — um reforço do posicionamento de ambos os serviços da mesma marca, mostrando sua força dentre os concorrentes.

Todos entenderam que o negócio é o streaming

As veteranas: Netflix, Amazon Prime, Globoplay… E as estreantes: HBOMax, Roku, Paramount+, Disney+, Star+, Crunchyroll. A disputa pela atenção do público ficou visivel no meio do pavihão, com as grandes produtoras de conteúdo impulsionando seus serviços com focos estratégicos diferentes.

Alguns destaques:

  • A HBO, que já compareceu em anos anteriores, dessa vez foi como HBOMax na estratégia da Warner de elevar a presença da marca totalmente no streaming para o CCXPverso, monstrando as novidades e variedade de seu catálogo, do cartoon ao esporte ao vivo.
  • Disney+ focou em promover o combo com Star+, como detalhei anteriormente.
  • Paramount+ trouxe as novidades exclusivas do streaming sobre a expansão de universo de seus IPs de maior sucesso (como Teen Wolf).
  • A Netflix brilhou mais uma vez com um dos maiores estandes do evento, apostando em mostrar diversas de suas IPs, umas mais interativas e outras algo mais como um poster gigante ou uma baleia pendurada no teto. Não somente sobre suas séries, mas traduziram melhor que nunca a “vibe Neflix”, com arcos simulando as fitas coloridas da abertura (que você podia tirar fotos bem conceituais ali), um espaço enaltecendo a cultura do meme e até um tapete rosa vibrante cobrindo parte do chão de uma das ativações (era estranho andar ali, mas era satisfatório ao mesmo tempo… enfim, o branding sensorial — tato).

Era óbivo que os streamings estariam fortes nessa edição depois das movimentações das marcas e de negócios feitas durante a pandemia. Eles vieram com tudo e a CCXP vai se tornar o grande palco físico da guerra dos streamings no final das contas (e longe da gente reclamar disso, pois quanto mais empolgantes e incríveis os estandes, melhor).

#FoiÉpico e ansiosa para a edição de 2023! ❤

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Isabella Lopes

I’m a creative strategist, a rebel designer, an artistic thinker and curious challenger. x